quinta-feira, 8 de março de 2012

O Futuro que Não Vem (Falcão: meninos do tráfico).

Wanderley Rebello Filho
Minha “filosofia” superficial de escritório já me permite concluir algumas coisas: só existe o passado, o presente e o futuro não existem!
Para mim, as imagens, da infância perdida pelas crianças que, abertamente, confessaram o seu envolvimento com o tráfico, não revelaram grandes novidades. Pelo contrário: depois de mais quase 15 (quinze) anos trabalhando com Direitos Humanos, posso dizer sem medo de errar: é muito pior do que o que vimos!
O passado existe, está dentro de nós, agora um pouco pior. O presente... o que é o presente? Quando achamos que estamos vivendo no presente, ele já passou, e quase que imediatamente ele se transforma em passado, e passa a viver em nossa lembrança. O futuro então, nem merece comentários. Existirá ou não! Logo, salvo engano, só existe o passado!
O que eu quero com isto, onde quero chegar? É que o documentário citado, “Falcão – Meninos do Tráfico” já passou, é passado, e não resistiu ao paredão do BBB da última terça-feira. De um documentário que deveria dar ensejo ao estudo sério dos direitos humanos fundamentais, e a políticas e projetos sociais também sérios, voltados para a proteção integral das crianças e dos adolescentes, como manda a Constituição Federal, muito pouco vai restar, senão a indignação momentânea e passageira que não tirou o sono de muitos, muito menos a preocupação da maioria.
Mas, sabem qual é a grande ironia? Nós seremos as vítimas dos futuros “Falcões”, como já somos há muito tempo. Eu, o senhor leitor, nossos filhos, nossos netos... Mas, também, somos todos culpados, por ação e/ou por omissão! Somos todos culpados porque, no mínimo, não berramos com o poder público para que eles tomassem uma providência. Alguns se sentiram aliviados quando souberam que, dos 16 Falcões, 15 já haviam morrido. Mas, senhores, podem me acreditar, há milhares nas filas esperando.
O nosso Estado é um balão pronto para estourar, e nós precisamos descobrir, com urgência, o ponto exato que antecede a sua ruptura, porquanto não dá mais para suportar tanta miséria, indiferença e degradação. Não podemos mais suportar nosso sistema de saúde em frangalhos, nossa educação aviltada, e nossa esperança amputada: não há prótese para isto! A dignidade de todos os seres humanos, em nosso Estado, não passa de letra morta da Constituição Federal, e às vezes me parece que nossas autoridades estão esperando chegar até o limite em que podem ir, mas pode ser que elas descubram, tarde demais, que foram longe demais.
Senhores, são mais de 30 milhões de pessoas vivendo em estado de miséria em nosso País, e mais de 60 milhões vivendo em estado de pobreza, o que é muito diferente, todas sem conseguir a satisfação de suas necessidades mínimas, e de seus direitos mais urgentes, como trabalhar, estudar e se alimentar. A cena das crianças à disposição do tráfico, e dele vivendo, nos remete a um País que, em vez de esperança, apresenta aos seus menores o medo e a violência. Nosso Estado, senhores, há muito tempo decidiu participar do banquete supremo da civilização: o da decadência.
Os Falcões continuam voando sobre os nossos Céus, e eles querem apenas viver o suficiente para conhecer uma menina bonita, uma arma poderosa, e uma sensação entorpecente de droga e de poder. Está bom assim! Para que mais? Nós não podemos deixar tudo para o Estado, senhores, porque eles têm que se preocupar, agora, com as próximas eleições. Mas, diriam vocês, nós não temos que nos preocupar com isto, está tudo lá longe no Rio de Janeiro... mas, eles têm asas, senhores, e podem voar até aqui! Parte da tragédia reside no fato de muitos acharem que jamais vão ser alcançados, e que as coisas são assim porque assim elas têm que ser. Pode ser!
Mas, como diria Juan Ramón Jimenez, “Vai devagar, não corras; pois, aonde tens que ir, é só para ti... Vai devagar, não corras, que o menino de teu Eu, recém nascido, Eterno, não poderá te seguir!” Que ensinemos isto aos nossos “meninos falcões”, antes que eles nos mostrem o que aprenderam de pior. Já foram destruídas uma, duas, três... “quinze” rosas de nosso “jardim de meninos falcões”, mas não podemos deixar que se destrua todo o nosso jardim. A esperança tem que ser a última a morrer! Rio de Janeiro, 22 de Março de 2006.

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